quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Mariana, tire os cavalos da chuva

Alguma coisa o incomodava precisamente na região lateral do nariz, um pouco abaixo do olho esquerdo. Alguma coisa entre uma pressão e uma coceira, com um pouco de emoção também. Era como se só uma, essa parte do seu corpo, estivesse chorando de emoção enquanto assistia a uma ópera. Pensou se deveria parar para pensar naquilo tudo, e no seu significado, sua origem, mas concluiu que daria muito trabalho e preferiu caminhar tranquilamente sobre botas e entre calças jeans, até a cocheira de sua casa. O ploc ploc ploc das botas na madeira encerravam o almoço que quase sempre consistia de costelas de boi assadas.

Bob Blue estava de quatro, como sempre e bebia água. Ao avistar Johnny The Joe, relinchou e deu uma mijadinha.

Conheceram-se havia sete ou oito anos quando Johnny The Joe ajudou Mirta James, mãe de Bob Blue num dia em que ela havia acabado de se perder do marido durante uma tempestade e passava fome sob uma árvore com seus três pequeninos. Deu-lhes água e um pouco de capim que carregava sempre com ele. Johnny The Joe tinha então 21 anos e morava com seu avô Billy. Bob Blue tinha apenas ano e meio de vida.

Nunca mais se desgrudaram e até hoje são muito amigos. Bob se casou e teve 4 filhos, que ainda moram com ele.

Nesta tarde de domingo, Johnny precisava resolver uma questão antiga com os Mahoney, clã do sul que não se dava com a família de Johnny e discordava dela no que se referia ao destino de duas afluentes do Rio Moon.

E discordar quanto ao Moon, meu caro, ah... era coisa pra muito chumbo queimado.

Parceiros, seguiram Johnny The Joe e Bob Blue em direção ao sul, pela Golden Road. Passaram por Cancro Duro, índio amigo, filho de mulher branca, que tinha uma barraquinha de cds piratas, logo ao lado do Matadouro do Moe. Seus filhos Giuseppe, Ricardo e Jean Claude, aproveitaram a descendencia e formaram um grupo de música peruana, com aquelas flautinhas de bambu, o que lhes garantia alguns bons trocados.

Depois, veio a estrada. Ela mesma, grande e imponente. The Golden Road, que alguns bairristas cismavam em chamar The Golder.

Em alta velocidade, logo após a curva dos Mackenzie, que tem esse nome porque foi la que morreram todos os 7 integrantes dessa infeliz família em acidente de carroça, Johhny The Joe deixou cair uma lágrima. Não pelos Mackenzie, mas não sabia porque, lembrou-se dos bolinhos de sua avó.

A pastelaria dos Fung Huang, cowboys chineses da tribo dos Hinhauwn, indicava a proximidade da fazenda dos Mahoney. Johnny fez o mesmo sinal de sempre, que mostrava a Bob Blue a passagem de comando. Queria estar com ambas as mãos livres para empunhar Mariana, sua espingarda do peito.

Em prata de lei, com detalhes em marfim e diamantes, Mariana ja havia cuspido muito fogo. Johnny, homem rude porém carinhoso, era apaixonado por Mariana. Tinham horas de conversas em frente ao fogo, antes de dormir e sempre, eu disse sempre antes de sentar o dedo em Mariana, Johnny soltava seu grito de guerra, ainda em trote: -Mariana, tire os cavalos da chuva!

Há anos era assim. Fosse por questão de honra, fosse para caçar ou pra assustar passarinhos. Johnny The Joe pegava Mariana com uma mistura de força e delicadeza, acelerava em cima de Bob Blue e gritava: -Mariana! Tire os cavalos da chuva! E sentava chumbo grosso.

Foi o que fez: lançou um olhar de cumplicidade para Bob Blue, acariciou seu lombo, depois voltou-se com tranquilidade e determinação para Mariana, alisou seu corpo, parou o olhar no rubi em forma de gota encravado em seu dorso, teve cheios os olhos de lárgimas, posicionou-lhe o dedo no gatilho e gritou: -Mariana, tire os cavalos da chuva!

Acertou em um, dois, três, quatro, cinco porcos de raça que os Mahoney criavam.

Puxou forte a rédea e fez a curva quase derrapando.

Saiu às gargalhadas.

Considerou-se vingado.

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quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

A BOA MARIANA

               À noite, choveu grosso. E a boa Mariana parou à janela para admirar. “Água bastante para desencardir os pastos”, pensou, agarrando-se excitada aos babados do avental. Para uma mulher como aquela, em cuja face se lia gravada a ancestral devoção aos patrões – e talvez uma única e inconclusa linha a respeito de uma paixão deixada na juventude – um temporal daqueles, com raios de luz estourando nas vidraças, era capaz de fazer estremecer suas pernas e enchê-la de um estimulante sentimento de ameaça. Embora os riscos possíveis consistissem simplesmente em receber uma bronca da governanta, caso esquecesse de retirar as roupas do varal, o que não acontecera, e o de encher de lama os sapatos no caminho para o pomar na manhã seguinte, o que resolveria calçando botas, ela se lembraria de adicionar às suas orações dominicais um agradecimento por haver atravessado a tempestade em segurança. E nas tardes subseqüentes, nos intervalos ociosos entre almoço e chá vespertino, ela se sentaria ao fogão à lenha e entoaria cantigas alegres, retardando ainda acesa a fagulha daquela aventura. E as semanas correriam leves, o trabalho renderia sem cansaço e tudo aquilo lhe daria forças para despertar todos os dias mais cedo e trabalhar com mais afinco, até que – não sabia.
               A patroa chamou o seu nome. A boa Mariana desprendeu-se da janela com um salto para trás. Correu para atendê-la e foi encontrá-la no quarto, em companhia do filho. Disse-lhe que naquela noite viriam visitá-los o Conde e sua filha e que teria pouco tempo para deixar tudo em ordem. Desceu as escadas velozmente, em direção à copa.
               Horas depois, escutou passadas do lado de fora e logo avistou a figura solene do Conde, desembarcando do coche, auxiliado pelo criado. Vestia farda de gala, com o reluzir de ouro no colarinho e nos punhos, e uma espada bem polida pendurada na cintura. Atrás dele, uma silhueta diminuta remexeu-se dentro do veículo. O lacaio virou-se novamente e, então, a boa Mariana pôde enxergar a jovem de pele muito clara e cabelos negros, envolta em camadas de renda cor-de-rosa, aproximar-se do local onde ela se encontrava parada. O rosto da moça iluminou-se do amarelo dos lampiões, próximo à porta, quando identificou seus olhos claros e os lábios sedosos de framboesas. A patroa pediu para que ela tirasse os cavalos da chuva e lhes providenciasse água e feno. Já puxava os animais no sentido do estábulo, com ajuda do cocheiro, quando percebeu que a jovem e o filho da patroa olhavam-se enamorados. Súbito, veio-lhe a vontade de vomitar.
               Do estábulo, foi direto à cozinha, onde os demais empregados encontravam-se em plena atividade. Secou-se com um pano velho que lhe estendeu a cozinheira e seus olhos vaguearam pela paisagem na janela. A chuva caía com força, engrossando o rio que corria em descontrole. Os relâmpagos chicoteavam o ar, além dos morros. A boa Mariana permaneceu ali por alguns minutos e pensando nos perigos que aquela noite chuvosa oferecia, desejou que aquilo lhe ocorresse naquele instante.

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domingo, 18 de janeiro de 2009

Caíram no meio da praça, juntos, como sempre andaram. Ninguém pareceu se importar ou ver. No meio de um dia ensolarado de verão, crianças correndo, casais conversando, pessoas de bicicleta e lá no meio de um canteiro, eles caídos e ninguém para ajudá-los. Não faziam falta ao cenário, a praça continuava cheia, todos alegres. Depois de tantos anos, na velhice, as pessoas podem se tornar desnecessárias. Seu Mario, durante muito tempo o único pediatra da cidade, fora muito importante, seu telefone nunca era esquecido pelas famílias, tocava sempre, em especial em dias de verão, quando acidentes de bicicleta erma comuns. Dona Aurora costumava atender os telefonemas, enfermeira formada, muitas vezes solucionava dúvidas sem nem precisar consultar o marido, Limpar bem com água boricada Dona Vânia, vai parar de sangrar. Se não para a senhora traz o Paulinho aqui que o Dr. Mario atenderá. A qualquer hora, a senhora já sabe. Mas tenho certeza que o sangue vai estancar!, sorria e desligava sabendo que o machucado ia sarar e dali a uma semana Paulinho arranjaria outro, como todos os meninos de 8 anos. Enquanto isso Dr. Mario atendia bronquites, cataporas, um e outro sarampo e tantas outras enfermidades infantis. Sempre com a casa cheia, pois o consultório era na primeira sala da casa, a primeira porta à direita da porta de entrada, mas as crianças, e seus pais, sempre se espalhavam, falavam com Dona Aurora, brincavam com os 4 cachorros da família, faziam farra no quintal interno enquanto esperavam. Quando algum guri estava realmente mal, Dona Aurora leva para um quarto nos fundos, com uma cama, onde podia descansar enquanto esperava a consulta do doutor. No meio tempo, Carlota, a empregada, preparava um bolo e café, porque no consultório do Dr. Mario ninguém ficava sem bolo no final da consulta. Tinha criança que só comparecia por causa do bolo e pai que só levava o filho por causa do café. Carlota, uma negra alta, com dois filhos que foram "salvos" pelo doutor, gostava de ver o alvoroço. Carlota já tinha morrido fazia 10 anos, naquele domingo de sol. A casa de Dr. Mario e Dona Aurora já não era mais referência da cidade. Com o posto de saúde, a população mais humilde deixou de pedir favor, pagar metade do preço da consulta, coisas que Dr. Mario fazia com alegria. Agora tinham direito a médico, não precisavam pedir. As famílias mais ricas iam para o hospital particular, na cidade vizinha, nem 20 minutos de carro. Achavam mais confiável um hospital, com todos os exames possíveis, a um consultório na casa do médico. Os conselhos de enfermagem de Dona Aurora eram considerados ultrapassados, chás eram coisas de avós, muito melhor tomar um remédio mesmo. Assim, o casal foi esquecido, sem filhos, sempre dedicado aos filhos dos outros, viraram fantasmas na cidade, sem ter o que acrescentar àquela sociedade que não queria saber deles. Quando caíram, naquele domingo quente, em mais um passeio de mão dadas no meio da praça, como faziam desde os tempos de namoro, há mais de cinqüenta anos, ninguém correu para ajudar. Mas depois de algum tempo, algumas crianças passaram correndo pelo canteiro distante da praça e viram os corpos de dois velhinhos caídos. De esquecidos, Dr. Mauro e Dona Aurora viraram notícia da cidade, pelo menos na hora da morte. Foram enterrados juntos, e muitas pessoas compareceram, antigos pacientes, filhos destes, gente que nunca tinha se importado em saber quem era aquele casal antigo. No cemitério, num momento que deveria ser triste e melancólico, começaram a ser trocadas receitas de bolos, dos remédios amargos, do carinho. De repente, ao longo da semana, histórias do Dr. Mauro e Dona Aurora foram sendo mais e mais resgatadas. Crianças paravam na casa velha e ficavam olhando, criando histórias sobre aqueles velinhos. Receitas de chás voltaram à moda. O legado daquele casal dos tempos de antigamente se tornou mais vivo após sua morte. Voltaram a ser úteis e ficariam satisfeitos com isso.

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quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O FIM DO TREMA

               Coçou os olhos com força desejando queimar as imagens que vira, no calor das mãos. Então por um instante o mundo transformou-se na névoa fina suspensa de cegueira, até que a luz correu liquefeita entre seus dedos, despertando-o de volta ao escritório, ao edifício, à tarde em que se encontrava. À sua frente, retomando o gesto do ponto onde parara para contemplá-lo novamente espantada, até ser flagrada por ele neste espanto, ela então acomodou o telefone entre o ombro e a orelha, enquanto suas mãos trabalhavam no correr de páginas do catálogo, atrás de um médico.
             Aquilo começara pela manhã. Após despertar, sem suspeitar de nada de errado, teve pressa em se aprontar e se despediu da esposa com um aceno. Tomou o metrô em direção ao centro da cidade e já ia sacando da pasta o jornal amarrotado da véspera que não tivera tempo de ler, quando uma parada brusca do trem fez com que fosse ao chão, arremessando pasta e jornal, e indo ver-se entre as sandálias de uma adolescente e os mocassins de um rapaz, todos o encarando assustados. Alguns vieram ao seu socorro, ao que ele constrangido recusou qualquer auxílio. Alguém lhe trouxe a sua pasta; o jornal fora parar debaixo de algum banco e não foi encontrado. Quando quis erguer-se, batendo a poeira do paletó, sentiu o corpo desequilibrar-se para frente e para trás, depois voltou a tombar de lado para novo espanto geral. Então, deu-se o que se deu: tonto, foi perceber que seus pés haviam desaparecido!
               Com esforço, engatinhou da estação até o escritório, que por sorte localizava-se bem ao lado. No elevador, o ascensorista comentou nervoso a respeito de um esporão que quando cismava de doer, não podia sequer pisar no chão. Mas ao saltar no andar, já não eram mais apenas os pés: as pernas sob os joelhos sumiram evaporadas. Arrastando-se, alcançou a porta e se trancou em sua sala. Avistou a cadeira que a cada momento parecia mais alta e, a muito custo, conseguiu sentar as costas sobre ela. Permaneceu até o horário do almoço, recluso, pensativo. À secretária, dissera que não estaria para ninguém. Pouco depois do meio-dia, porém, quando restava dele apenas o segmento acima do peito, decidiu convocá-la para uma última ordem.
               Que viesse o médico. A funcionária correu apavorada, para buscar o catálogo de telefones. Quando conseguiu chamá-lo, entretanto, compreendeu que era tarde demais para qualquer medida, clínica ou cirúrgica, posto que já não havia mais nada do homem, senão a sua cabeça – que nem doía. Atônito, ele então pediu para ser deixado só com os seus pensamentos, que eram tudo o que lhe sobrara. Meia hora depois, adentrou a sala a secretária em companhia do médico. Acharam-na vazia.
             Os dias passaram aparentemente sem sobressaltos. A secretária continuou a trabalhar no mesmo escritório. Em uma tarde, já no final do expediente, lembrou-se de que precisaria consultar o médico acerca de certas mudanças de comportamento em seu filho, para-quedista da Aeronáutica, que a andavam preocupando. Lembrou-se de onde havia visto o catálogo de telefones pela última vez e foi buscá-lo. Ao entrar naquele local novamente, durante breves segundos, pegou-se pensando no antigo chefe e na sua própria vida e terminou lamentando que aquele mundo, gradativamente, fosse perdendo o seu charme.

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terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Um trema numa qüinta-feira

Zé Luiz era o tipo de cara pacato e sacana. Sempre sorrindo, simpático, do porteiro à secretária da repartição, a quem aliás chamava mentalmente de putinha feia, logo após seu sorridente cumprimento. - Bom Dia, Dona Quitéria... e lhe vinha o pensamento imediato: “Quitéria, a putinha feia”. Zé não tinha certeza se produzia tais pensamentos ou se eles simplesmente apareciam e não era possível controlá-los. Fato é que não se importava com isso e até se divertia.

-Fala, Moreira... “como é ter essa sua cara de corno?”, -Bom Dia, Genival... “Genival e a cabeça do meu pau!” E ele ria e ria e se divertia com essas bobagens, fazendo com que todos pensassem que se tratava apenas de simpatia, o que aliás combinava com seu aspecto bonachão.

Gordo, gordo, tinha cabelos nas costas até a nuca, bochechas rosadas e estava quase sempre suado, mesmo no inverno. Era dessas pessoas que conseguem suar e rir ao mesmo tempo.

E Zé tinha um cargozinho bobo como ele. Filho de militar e de família tijucana, fez concurso assim que terminou o colégio e foi comemorar todo animado a aprovação na Confeitaria Colombo do centro, como havia lhe prometido sua tia Guida, irmã mais velha de sua mãe. Seu trabalho consistia basicamente em receber processos e encaminhá-los ao setor responsável. Também fazia atendimento ao público, numa média de cinco ou seis por dia, momentos que considerava como aqueles “que fazem uma vida valer a pena”. Eventualmente, ou a cada seis meses, fazia um relatório geral.

Nessa quinta-feira, dia em que Zé Luiz gostava de se masturbar antes do trabalho, estranhou seu quarto ao abrir os olhos. Não reconhecia como seu. Não reconhecia como um quarto. Não se reconhecia.

Nessa quinta-feira, dia em que Zé Luiz, costumava passar pela Igreja da Nossa Senhora da Aquerupita antes do trabalho, acordou zonzo, vestiu-se com a fantasia de Zorro que ganhara há dois meses como pagamento de uma aposta, errou o caminho e foi parar no mercado de peixes. Tinha o olhar vago e parecia não se reconhecer no mundo. A máscara que usava estava um tanto quanto torta e obstruía parte de seu olho esquerdo. Não sorria, não falava, limitava-se a respirar ruidosamente, como faz um porco espinho no calor. Mesmo assim foi possível saltar sobre o balcão, apanhar um facão de peixe e passar a cortar um por um, dos pequenos aos enormes, dos crustáceos aos moluscos.

Tentaram contê-lo mas foi impossível e Zé Luiz saiu correndo rápido, como da última vez, na aula de educação física no colégio militar. Estava todo babado de baba de peixe, fedendo e escorregando em suas havaianas velhas de palmilha branca amarelada e tiras azuis. Na esquina com a Rua da Reforma, ouviu um sino agudo e isso pareceu despertá-lo. Era o bonde das dez, avisando a curva, mas já era tarde.

Zé Luiz escorregou e deslizou no paralelepípedo morno da manhã. O bonde dividiu e esmagou seu corpo em dois e duas bolas de carne foram formadas, como dois pontos, uma junto da outra, logo acima do bonde tombado.

Na manhã seguinte, na primeira capa do Correio Carioca, uma foto e a manchete: Trema e tragédia: Bonde parte ao meio funcionário ensandecido.

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sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Pode até ser um clichê

Insanity laughs under pressure we're cracking
Can't we give ourselves one more chance
Why can't we give love that one more chance
Why can't we give love give love give love give love
'Cause love's such an old fashioned word
And love dares you to care for
The people on the edge of the night
And loves dares you to change our way of
Caring about ourselves
This is our last dance…


(Under Pressure, Queen)


No sabe si soñaba, no sabe tampoco si era verano, invierno. Soñaba y tocó la alarma, se despertó agitado, sintió los brazos de su madre rodeándolo y se sintió protegido. De repente se escuchó un ruido muy alto. Se asustó. Lo abrazaron con mas fuerza. Abrió los ojos y no pudo ver. Estaba todo oscuro. Sentía claramente el latido del corazón que lo abrazaba. La respiración jadeante de quien lo llevaba en brazos lo hacía sentir vivo. En esos momentos quería ser una pluma, para aliviar el peso de esa mujer. Otro ruido. Este fue más cercano. Un silencio. Gritos, gritos de personas, mujeres, hombres, fuera de si. Desesperación. Huele a humo, está lleno de arena blanca. Se hace difícil respirar. No entiende. Cae al piso y llora. Nadie lo recoge, está solo. Solo le resta llorar mientras tenga fuerzas. Duerme e intenta soñar. Aquí nadie está en guerra. Aquí no hay excusas, ni motivos ni razones. No es mas que un niño palestino queriendo soñar.

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quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Calor intenso, ar parado, mosquitos, o suor do corpo que molhava o lençol, apesar disso ela sonhava. Era uma fuga daquela noite quente e abafada. No sonho poderia estar em algum outro lugar, mais fresco. Ou no mesmo Rio de Janeiro, que em seu sonho poderia ser uma cidade temperada, com neve em pleno janeiro. Podia sonhar qualquer coisa, escapar da realidade. Mas não de si mesma. Em seus sonhos encontrava algo de seus desejos, todas as noites. Naquela noite de verão encontrava não o frio que poderia desejar acordada, mas o calor de um corpo que nem bem sabia que desejava. Ele estava lá, visitando-a no meio da madrugada, sem falar, apenas dirigindo a ela aqueles olhos onde um dia ela imaginou que poderia se perder. Deitando-se ao seu lado, tomando-a nos braços, percorrendo seu corpo com as suas mãos e seus lábios quando então o estrondo do trovão a acordou.
Chovia lá fora, estava menos quente e mais úmido. No quarto continuava sozinha e frustrada, sem ele. Como na música. Ou não, talvez ele fosse só um desejo seu. O homem real fora tão diferente daquele por quem se apaixonara que talvez tivesse vivido um sonho acordado por alguns meses. Até que o sonho se desfez, sem estrondo, com alguma chuva e tristeza. Como o verão que se vai nas chuvas de março, seu sonho de amor, quente, vibrante, alegre e sensual, digno de um verão tropical, se foi em meio às suas lágrimas, e as dele. O relacionamento acabara. Mas o sonho persistia em lhe visitar nas noites quentes de verão. Coisa desses desejos intrometidos que se esgueiram pela vida e tudo desorganizam, tal qual fadas em comédias medievais.
We are such stuff
as dreams are made on, and our little life
is rounded with a sleep.
William Shakespeare

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A VIDA É SONHO

“¿Qué es la vida? Un frenesí
¿Qué es la vida? Una ilusión,
una sombra, una ficción,
y el mayor bien es pequeño;
que toda la vida es sueño,
y los sueños, sueños son”.

Calderón de La Barca


               Acordou a esposa de madrugada. Havia sonhado. A mulher encarou a escuridão do quarto atrás da qual pôde adivinhar o rosto meio assustado, meio eufórico do marido, o sorriso largo desenhando um crescente de lua e o olhar fixo em um ponto calculado no espaço abstrato do leito em que ela se encontraria, imersa em sombra. Repetiu, havia sonhado. Ao que ela nada respondeu e ele pôde adivinhar o rosto cansado de quem não dormia havia semanas que ela costumava fazer toda vez que ele a despertava no meio da noite dizendo-lhe que: havia sonhado. O colchão trepidou, ele sentou-se se espreguiçando. Sentia-se leve. O sonho obrigava-o a ficar de olhos bem abertos, massageava suas tensões qual um bourbon, acometia-lhe o olfato com aromas de chá. Ergueu-se lentamente e caminhou em direção à janela, abrindo uma fresta na veneziana entre dois dedos. A rua vazia, apenas o uivo desafinado de um cão ao longe. E a luminosidade urbana que era penumbra enquanto a noite ia alta. “Fala logo e volta para a cama” - a esposa, entre lençóis, os olhos soterrados de exaustão. Mas ao invés da voz do marido, escutou um estalido, que era a porta destrancando, seguindo-se de passos rápidos descendo os degraus da escada, saltando de dois em dois e, por fim, o rumor do vento noturno inundando os corredores da casa aberta para a rua!
               Foi encontrá-lo a duas esquinas de distância. Sentado no meio-fio, as costas ensopadas de suor, a face desolada. Ao avistá-la, correu para os seus braços, aos prantos. O sonho abrira sem palavras e aos poucos fora empalidecendo, até desaparecer, oculto nas cores da vigília. Cobriu-o com seu corpo, sentindo ela própria a ponto de ausentar-se de cansaço e tristeza, e assim permaneceram por vários minutos. No final, ela disse: “vamos embora”. E foram - ele ainda equilibrado nas passadas mais seguras dela. A manhã veio e se foi.


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quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Começou

quente e ensolarado, bem tropical

repleto de desejos e esperanças renovadas

com festividades religiosas e profanas

seguiram-se chuva e sol

climas amenos, dias atribulados

mais festas religiosas e profanas

amores e sorrisos

perdas e choros

mas também rock, jazz, samba e eruditos

filmes, livros e teatro

algumas surpresas

muitas constantes

maresias

cheiro de mato

trabalho

algum descanso

sempre que possível, diversão

e tanto mais...

em dezembro termina

com Natal e promessas de verão

mais um ano novo se vai

enquanto outro já vai começar.


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