Um dia talvez contasse aquela história a seus netos. Não aos filhos, eles não entenderiam, mas os netos talvez, estariam distanciados pelo tempo, protegidos de julgamentos morais, ciúmes e outros sentimentos que por vezes turvam a compreensão.
Nem ela compreendia como pudera se apaixonar por um homem com um olhar. Como pudera viver o vislumbre de um romance, de uma outra vida, de outras possibilidades, em uma mera troca de olhares e palavras, no meio de uma rua movimentada, cheia de pessoas, barulhos, fuligem e calor.
Mas foi assim, numa tarde quente e ensolarada, em pela Avenida Rio Branco no Rio de Janeiro, que ela, casada com Otávio, mãe de Rafael, 5 anos e Helena, 3 anos, professora universitária de História, saindo da livraria Da Vinci, onde regularmente ia comprar livros, contente com o dia apesar de todo o calor, nesse dia comum, ela foi surpreendida por uma pergunta.
- Por favor, você pode me ajudar?
Parou e olhou para ele. Vestia terno preto, sapatos idem, uma mochila, o típico traje dos jovens executivos e advogados no Rio. Devia estar na casa dos 30, como ela. Não entendeu porque alguém tipicamente vestido estaria pedindo ajuda. Não devia ser para inteirar o almoço. Quase ao mesmo tempo, enquanto escrutinava a vestimenta e tentava entender a causa do pedido de ajuda, olho em seus olhos. E quase não conseguiu sair deles.
Ele sorriu ao seu olhar e demorou para falar.
- Preciso chegar à rua do Rosário, esquina com a Quitanda. Estou longe?
Só então ela percebeu o sotaque, mineiro, talvez. E começou a raciocinar.
- Não está longe, continue pela Rio Branco, mais a frente você verá a placa indicando a rua do Rosário, entre a sua direita e siga, pouco depois você já estará na esquina, lá também tem placa.
E sorriu, realmente achando divertido que aquele homem tivesse parado para perguntar algo tão simples, pois ele já estava no caminho.
Ele também sorriu.
- Um amigo me indicou vir de metro, mas sai na estação errada e já faz anos que não vinha ao Centro do Rio. Obrigado!
Todo o tempo mantiveram contato visual, como se nestes instantes só houvessem eles na calçada, como se estivessem perdidos num lapso de tempo-espaço. De repente precisava acabar, precisavam voltar para a rua cheia de gente, o calor, o barulho, mas se deram mais um instante.
- Por nada, você já estava no caminho certo.
Ele mexeu os ombros, ela ajeitou a bolsa. Eram os sinais de que o encontro tinha acabar. Nunca mais se veriam, não saberiam histórias um do outro. Mas já tinham uma história em comum. Naquele brevíssimo encontro, tiveram o vislumbre de tudo o que não tinham, tudo que faltava. Ela tinha seus amores, seu marido, filhos, amigos e família, trabalho, e ainda assim nunca estava satisfeita. Naquela tarde, ao olhar aquele executivo mineiro perdido no Centro do Rio, ao aproximar-se dele, entendeu que sempre haveriam outras escolhas, outras histórias, e que elas sempre fariam falta, uma falta constitutiva, impossível de ser preenchida. Ele, um desconhecido, lhe faria falta.
Ele disse um muito obrigado, estendeu a mão. Tocaram-se num aperto de mãos. Sorriram um pouco mais, com a cumplicidade de quem troca segredos. Desviaram os olhares e se foram. Cada um com a sua falta, agora identificada na imagem de uma história de amor vislumbrada mas nunca realizada.
Nem ela compreendia como pudera se apaixonar por um homem com um olhar. Como pudera viver o vislumbre de um romance, de uma outra vida, de outras possibilidades, em uma mera troca de olhares e palavras, no meio de uma rua movimentada, cheia de pessoas, barulhos, fuligem e calor.
Mas foi assim, numa tarde quente e ensolarada, em pela Avenida Rio Branco no Rio de Janeiro, que ela, casada com Otávio, mãe de Rafael, 5 anos e Helena, 3 anos, professora universitária de História, saindo da livraria Da Vinci, onde regularmente ia comprar livros, contente com o dia apesar de todo o calor, nesse dia comum, ela foi surpreendida por uma pergunta.
- Por favor, você pode me ajudar?
Parou e olhou para ele. Vestia terno preto, sapatos idem, uma mochila, o típico traje dos jovens executivos e advogados no Rio. Devia estar na casa dos 30, como ela. Não entendeu porque alguém tipicamente vestido estaria pedindo ajuda. Não devia ser para inteirar o almoço. Quase ao mesmo tempo, enquanto escrutinava a vestimenta e tentava entender a causa do pedido de ajuda, olho em seus olhos. E quase não conseguiu sair deles.
Ele sorriu ao seu olhar e demorou para falar.
- Preciso chegar à rua do Rosário, esquina com a Quitanda. Estou longe?
Só então ela percebeu o sotaque, mineiro, talvez. E começou a raciocinar.
- Não está longe, continue pela Rio Branco, mais a frente você verá a placa indicando a rua do Rosário, entre a sua direita e siga, pouco depois você já estará na esquina, lá também tem placa.
E sorriu, realmente achando divertido que aquele homem tivesse parado para perguntar algo tão simples, pois ele já estava no caminho.
Ele também sorriu.
- Um amigo me indicou vir de metro, mas sai na estação errada e já faz anos que não vinha ao Centro do Rio. Obrigado!
Todo o tempo mantiveram contato visual, como se nestes instantes só houvessem eles na calçada, como se estivessem perdidos num lapso de tempo-espaço. De repente precisava acabar, precisavam voltar para a rua cheia de gente, o calor, o barulho, mas se deram mais um instante.
- Por nada, você já estava no caminho certo.
Ele mexeu os ombros, ela ajeitou a bolsa. Eram os sinais de que o encontro tinha acabar. Nunca mais se veriam, não saberiam histórias um do outro. Mas já tinham uma história em comum. Naquele brevíssimo encontro, tiveram o vislumbre de tudo o que não tinham, tudo que faltava. Ela tinha seus amores, seu marido, filhos, amigos e família, trabalho, e ainda assim nunca estava satisfeita. Naquela tarde, ao olhar aquele executivo mineiro perdido no Centro do Rio, ao aproximar-se dele, entendeu que sempre haveriam outras escolhas, outras histórias, e que elas sempre fariam falta, uma falta constitutiva, impossível de ser preenchida. Ele, um desconhecido, lhe faria falta.
Ele disse um muito obrigado, estendeu a mão. Tocaram-se num aperto de mãos. Sorriram um pouco mais, com a cumplicidade de quem troca segredos. Desviaram os olhares e se foram. Cada um com a sua falta, agora identificada na imagem de uma história de amor vislumbrada mas nunca realizada.
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